quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Arroubos

No quarto os arroubos de um amor ficaram
Marcas no lençol, tão periciais
delatam-te as coxas sobre a cama
Rastejando os joelhos com impiedade

Os cacos no chão denunciam-te a torpeza,
O furor de roubar o berço só para ti,
Jogando para fora tudo o que não fosse nós

O vermelho úmido no piso me faz lembrar teus lábios
macios e desejosos
Aquela flor quente latejando de prazer

E tudo mais que por aqui há,
Lembra loucura, convulsão, suor
Calor, gemidos, desejos
Até o fenecer dos corpos no espelho

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Canticum



Despertai com o fogo
do sol toda a quentura
de existir

Acorda!
E recobre-te com os linhos vermelhos
Dirige teu ânimo a um lugar
e sem pensar no dia do trabalho
como que o dia acabde
ergue teu cálice,
ergue tua mão,
vira em teus lábios
e sejas feliz!

Acaba tua luz
frígida
com alegria melancólica
Lembra-te de teu amor
e bebe
Como se bebesse em teus fundos olhos

Tua taça te dá puro mel
então tu choras
Choras com o pulmão travado
porque foi ensinado aos homens
não chorar

Se de ti não se vê lágrimas
e se te acaba a luz
e se te acaba o ânimo
que não se acabe o vinho
antes de ti acabar

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Quarto


Lençóis desarrumados e cheiro de tabaco no ambiente mofado e escuro.
Ainda vejo a brasa do Garam ao lado da cabeceira
O som do chuveiro ainda canta com despedida dos murmúrios aos meus ouvidos
As doces unhas escarlates já se foram
A voz vermelha disse adeus!
Levou de mim o que havia na carteira, uma carteira de cigarros e um copo de uísque
Vagabunda! Esqueceu de devolver-me o coração.

Olhinhos Negros


Olhinhos negros, quanto tempo tens enquanto esse horizonte?
Quanto de tristeza há em ti fora do teu egoísmo?
Quantas são as cores do teu monocromático artificial?
Ou será que fostes pintado pela ausência de luz de tua alma?
Olhinhos negros, não deixem que tua pequenez se apague neste brilho lacrimal
Lanço-me para dentro de ti e só me acho num vazio
Quantos tempos, meus olhinhos negros, ainda tens diante deste nada de minha alma? ...

Sanguesedento


É um ópio o sangue que bebo
Meu próprio sangue em desapego
Sumo em meio a dor que já é dormência
Sumo sempre, fico em aparência
Quem aqui me vê não vê nada
Me vela a vela no caixão que se acaba
Meu próprio corpo!
Como vampiro, tomo minhas forças, tomo minha dor
E aonde mais possa adormecer na escuridão
Desde que me haja cor

sexta-feira, 25 de março de 2011

Amontoador de Nuvens

Me atrevi despudorada a olhar o que vivia sob aquela túnica
Quente, tocante, leve foi a luz que incidiu sobre meus olhos
Rubra, minha tez vibrava
Enquanto aquele cajado de Zeus entesava contra mim

Como quem desafia a tempestade,
Empreitei meu seio de encontro ao vento
Ao sentir a escuridão me acariciar as pálpebras cerradas
Tive coragem de me entregar
Dancei !
Dancei !
Dancei com minha estrela
E quando já estava dormente todo o meu templo de Espírito
Senti o súbito arfar do peito e o leve desencaixar da carne

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

O Sexo do Anjo

Os anjos têm sexo. Eu descobri.
Numa tarde dessas que a gente fica em qualquer lugar à espera de um milagre, ele veio.
Trazia em uma das mãos uma garrafa com um líquido alucinógeno. Na outra, um vazio.
Com a mão vazia veio, a mando de um Deus, me abraçar; sussurrando coisas aos meus ouvidos que eram superiores às verdades bíblicas. Me falou da luxúria, da preguiça... do pecado que era viver. Revelações que ninguém mais saberia. Apenas eu, naquela tarde 11.
De repente puxou uma lança e devagar e forte a enfiou contra o meu peito. Sem que houvesse tempo para um suspiro, ceguei. Vi o céu onde era o meu inferno. Fui além.
Em um instante abri os olhos e senti aquele líquido escorrer pelas curvas de meu ventre, alagando os alvos lençóis.
Não. Eu não vi Deus. Mas agora sei que os anjos têm sexo. Aquele era um homem.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

A BUNDA (em letras garrafais )

A bunda redonda
A bunda branca, talvez
A bunda

A bunda me atrai
Excita
Porque a bunda é a bunda
Bunda
Bunda
Bunda

Não temos o que dizer sobre a bunda
Já que não é uma parte tão superior como braços, pernas, dedos, olhos
É simplesmente A Bunda
A Bunda
A BUN-DA
BUN-DA
BUnda
bunDA

A bunda nos atrai e pronto
Vai entender

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P.S.: Bonitinha sua bunda, hein?
P.P.S.: Ah, não tem bunda? Que pena.

Vin avec des Pommes

Sonhei com aquele vinho barato recendendo em teu hálito ao falar meu nome
Dançamos sem toque em cada gole ou no teu cigarro a me tragar
Beijei-te por outra boca
Vil, vulgar, a imagem que te atrai
Um farrapo com o qual querias te enxugar
Dançamos a cada gole
Amamos em cada máscara
Em cada rosto cálido que havia por lá
E acordamos na ressaca da realidade
Duas mesas:
Tu lá, eu cá

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Invocação

Acaso tu podes ouvir o que te escrevo, alguém que não existe.?

. . .

Não tenha pressa
Aprenda a esperar
Este vicio pequeno do falar
Que irrompe
Corrompe
Compromete
Cura-te
Cala-te.

A Corja

Somos aqueles que martelam e não incomodam; somos a língua estranha, os balbúrdios
Os que nascem na memória dos desmemoriados
Os sadios que merecem ser amarrados, que bebem sem medo dos vermes que rondam a água cristalina
Somos a mudança lenta, o movimento calado, o vento na cara e quem apanhou
Somos os pintores do cinza de monóxido que criam cores nos pórticos fedidos
Somos o ferrolho aberto esperando a revolução
Somos o silencioso corte no útero da parideira
A vontade da vida escondida nas 7 horas do relógio
Somos o muito do pouco arroz, do pouco ouro
Somos a riqueza da simples miçanga no rastafári do negro que varre a rua
Somos os incompreendidos, drogados de vida, escondidos atrás das barbas
Somos os sem-analistas do divã do ônibus; os frangos desalmados do congelador
Somos os poetas da língua amputada, o gás, o carvão
Somos os livros não escritos pelas mãos da enxada que não sabe escrever
Somos a manta do frio da febre do trabalhador autônomo que não tem autonomia
Somos a dignidade do cartão de crédito não concedido
Somos a fila que corre vazia na porta dos supermercados
Somos todos os seres, somos todos os nadas
Somos todas as vidas, mudas, surdas, caladas!